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Pesquisa aponta que apenas 8% dos resíduos sólidos produzidos na área urbana necessitam ir para o aterro sanitário; hoje 98% tem este destino

O Projeto Pró Natureza Limpa, capitaneado pelos cursos de Engenharia Química, Ciências Sociais Aplicadas e o curso de Química da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – campus Toledo, abriga diversos experimentos sobre a gestão e desenvolvimento de tecnologias e processos para o tratamento do lixo, transformando-o em uma possibilidade de negócio. E foram estes estudos que diagnosticaram que das 70 toneladas dos resíduos sólidos produzidos diariamente, na área urbana de Toledo, apenas 8% deveria ir para o aterro sanitário e 92% desta produção é passível de reciclagem e consequentemente geraria emprego e renda. O professor Dr. Camilo Freddy Mendoza Morejon, conversou com a Casa de Notícias sobre o projeto e revela que empresários de Pernambuco, manifestaram interesse pelo Projeto desenvolvido na Unioeste e já fizeram o pedido de transferência de tecnologia.

09/04/2012 - 20:11


O projeto fez um diagnóstico da situação do lixo em Toledo?

O projeto é formado por diversos estudos de caso. Alguns são relacionados a resíduos industriais, outros da linha rural, mas cada um com as suas particularidades. Especificamente, para os resíduos da área urbana fizemos um trabalho que, do ponto de vista da gestão identificamos um potencial de geração de resíduos sólidos, no Município de 70 toneladas dia. No atual cenário este resíduo estaria sendo destinado para o aterro sanitário e uma pequena proporção sendo reciclado ou coletado por meio do Programa Coleta Seletiva.

Destas 70 toneladas, quanto é possível reciclar?

A pesquisa mostrou que dos 100% do resíduo sólido gerado em Toledo, 69% corresponderia ao resíduo orgânico, 23% seria o resíduo reciclado e 8% os rejeitos. Uma das situações que chamou a atenção durante o projeto é que praticamente em torno de 98% do resíduo de 70 toneladas estaria sendo destinado para o aterro sanitário. Os 69% que compõe o resíduo orgânico poderia ter outra aplicação, como matéria-prima para a obtenção de produtos de valor agregado e, portanto, não seria recomendado que este resíduo fosse encaminhado para o aterro sanitário.

O segundo elemento, se você conseguir a separação dos 69% (resíduo orgânico), você teria 23% de recicláveis livres do orgânico misturados com o rejeito. Com isso a separação na triagem seria mais ágil e mais eficiente, além de um ambiente mais salubre. Tendo em vista que o principal problema é o ambiente insalubre que se cria no espaço da triagem por conta da contaminação com orgânico.

O que temos que fazer na gestão dos resíduos é implementar um programa diferenciado, aonde o elemento central seja a coleta do resíduo orgânico, preferencialmente, na fonte. Então questionamos qual seria a metodologia, isto é, como conseguimos separar o resíduo orgânico diretamente na fonte? Há três métodos: um seria aplicar programas visando a consciência ambiental, porém nos nossos dias parece que ainda estamos longe de conseguirmos uma aplicação efetiva que gere uma eficiência proporcional.

O segundo método seria aplicar o rigor da Lei. Se você não faz, você recebe uma punição. Isso poderia dar certo, porém o custo político desta metodologia é elevado.

O terceiro método seria com base no incentivo. Você faz a separação e recebe um incentivo por fazer isso. Para aplicar este método teria que identificar um valor comercial ou industrial ao resíduo que será separado, neste caso o orgânico, porque ele tem valor comercial e industrial, como matéria-prima para a obtenção de produto de valor agregado.

O que poderia ser produzido a partir do resíduo orgânico?

O resíduo orgânico é utilizado dentro do processo de transformação biológica para a obtenção de combustível gasoso, o biogás e biofertilizante que retorna para o solo. Nós criamos dois tipos de produtos com base no resíduo orgânico, sendo que o produto gasoso pode ser utilizado para a obtenção de energia térmica, elétrica ou créditos de carbono. Tudo isso traz uma expectativa de retorno. O material sólido depois de processado por ser utilizado como fertilizante, substituindo os convencionais.

No modelo proposto, cada residência receberia um recipiente com código de barras proporcional ao resíduo gerado pela família e no final do mês saberia quantos quilos aquela residência gerou e, a partir, deste valor ela poderia ter direito a uma compensação ou benefícios que poderia ser em dinheiro. Aquele material separado seria utilizado como matéria-prima e traria um retorno.

Os recicláveis poderiam ser comercializados como matérias-primas para outras indústrias e os rejeitos seriam destinados para um aterro sanitário, diferente do convencional. Nós sairíamos de um cenário de 70 toneladas que estaria indo para o aterro sanitário para outro cenário onde o aterro sanitário diferenciado receberia apenas oito toneladas.

Neste modelo, temos outro elemento interessante, o sistema atual de gestão de resíduos urbanos, o resíduo é tido como custo. A Prefeitura por meio do processo de licitação paga para uma empresa coletar e transportar o resíduo até o aterro sanitário. É um dinheiro que está sendo gasto e sai dos impostos e neste outro modelo como o sistema traz expectativa de retorno, você acabaria criando um novo modelo de negócio. Depois de implementado a Prefeitura poderia colocar na licitação para os empresários apresentarem propostas para terem o direito de explorar este novo modelo de negócio. Então neste processo de licitação não seria a Prefeitura que iria pagar, pelo contrário, a prefeitura iria receber e passaria o direito para quem apresentasse a melhor proposta. Você sai de um cenário de custo para um cenário de investimento.

Qual o investimento a ser realizado para viabilizar este projeto?

Existe um processo entre a fase de pesquisa e experimentação e a fase real. Na Universidade, nós fizemos um trabalho de pesquisa, experimental, desenvolvemos a tecnologia, a qual foi testada em escala de laboratório e os resultados preliminares mostraram a viabilidade técnica e econômica. Agora, a Universidade precisaria sair de uma escala de laboratório para projeto piloto e ainda fazer alguns ajustes necessários, depois partir para uma situação de escala real. Entre a escala piloto e real são necessários investimentos adicionais e, principalmente, parcerias com o setor público para efetivar estes trabalhos que é o que está faltando neste momento.

Qual seria a ordem destes investimentos para sair da escala de laboratório para piloto?

Depende muito do tamanho que você pretende estabelecer. Pode ser um bairro ou Município pequeno. Depende do espaço e do número de famílias em que o projeto será desenvolvido. Concretamente com relação a isso, recebemos no mês passado uma demanda de empresários de Recife (PE) que estão com um problema idêntico ao nosso com a diferença que eles têm uma Lei de gestão de resíduos do Município que obriga que todas as atividades geradoras sejam responsáveis por seus resíduos. Lá tem shoppings, supermercados, restaurantes e todos geram resíduos e o que chama a atenção deles são os resíduos orgânicos. Eles fizeram uma pesquisa no Brasil tentando achar uma tecnologia relacionada com resíduos orgânicos e visitando a região Oeste no Paraná chegaram ao projeto desenvolvido na Universidade. Depois tento detalhes do projeto eles se interessaram e entraram com um pedido de transferência de tecnologia. Durante conversas percebeu-se que eles estão com vontade de levar adiante aquele resultado da Universidade para uma escala piloto, porque eles já estimaram um volume de geração de resíduos orgânicos em 40 toneladas. Para este número foi definido o espaço que será necessário, o layout da instalação industrial, as características dos reatores, dos sistemas de purificação, secagem, locais para armazenamento entre outros. Um investimento preliminar totalizou em torno de R$ 2 a 3 milhões. O volume de resíduo orgânico gerado em PE é maior do que o volume gerado pela área urbana do município. Para Toledo seria um investimento menor, porém quando o sistema for implementado em PE, talvez nem precise mais fazer o piloto, porque poderíamos trazer os resultados daquele sistema para uma situação real em Toledo.

Qual é a projeção de tempo que precisaria para colocar projeto funcionar em escala real?

É uma questão de investimento, porque pode ser feito em cinco meses ou no máximo em um ano.

A Universidade possui um estudo de qual seria o impacto econômico deste modelo estudado?

Muito se trabalha com a questão do problema ambiental resultante da má gestão de resíduos como custo. O projeto pretende mostrar que o resíduo não deve ser visto como um problema, e sim, como fonte de oportunidade de geração de novos modelos de negócios. O resíduo não é mais resíduo, ele é matéria-prima ou insumo para a obtenção de produto de valor agregado. No momento existe tecnologia para estes 69% de resíduos, 23% de recicláveis e talvez faltassem pesquisas para atender os 8%, dos rejeitos. Mas, pelo menos, você sai de um cenário de 100% para 8%. A Universidade está pretendendo direcionar algumas pesquisas para o aproveitamento destes 8% de rejeitos.

A questão de geração de emprego e renda é uma consequência. O interessante é que não estamos fazendo isso pensando somente na questão ambiental, mas do ponto de empreendimento por meio do aproveitamento dos resíduos seja sustentável e que a questão ambiental seja uma consequência. Isso traz geração de emprego e renda, principalmente para pessoas de baixa ou nenhuma qualificação. Estes são os elementos da transformação de um problema em oportunidade.

Temos exatamente em torno de 20 toneladas de recicláveis, quase duas toneladas de rejeitos e 49 toneladas de resíduos orgânicos. Se direcionarmos estas 49 toneladas para um sistema de biodigestão para a obtenção de biogás e biofertilizante poderíamos ter uma expectativa de retorno econômico. Esta expectativa somada ao retorno que você conseguiria por meio da comercialização dos recicláveis teria um valor que poderia viabilizar o sistema. Além do mais, no valor atual você está tendo que pagar para alguém coletar, transportar e colocar no aterro sanitário. Neste sistema, você não estaria pagando por isso e estaria recebendo. O ganho seria por conta da expectativa do ganho econômico e no caso da Prefeitura aquele recurso que ela teria para manter o sistema no modelo convencional estaria sobrando e poderia direcionar para outras atividades correlatas ou fazer com que funcione o modelo de incentivo. O diferencial é que a Prefeitura passaria de um sistema de custo para um sistema de investimento.

A Universidade tem desenvolvido pesquisas, desenvolvido tecnologias... a transferência deste conhecimento é tranquila ou ainda há dificuldades?

Nesta questão da gestão de resíduos – tanto na área urbana como na rural – deve ser estuda e trabalhada de forma conjunta e articulada. Deve haver um estreitamento entre a Universidade, sociedade e Poder Público, em que o conjunto vai trazer resultados concretos que possam ser implementados. Às vezes, percebemos que ainda há algumas barreiras que impedem que os resultados gerados na Universidade cheguem a sociedade. Na Universidade, a exemplo deste resultado, tem outros resultados que podem ser aproveitados e, as vezes, pelo desconhecimento acabam ficando nas prateleiras. Esta articulação é fundamental para conseguirmos a aplicação do resultado da atividade intelectual.

Até 2004 prevaleceu o incentivo de geração de conhecimento. A partir de 2004 se incentivou a aplicação do conhecimento. Nós criamos como meta conseguir uma efetivação entre a Universidade, centro de pesquisa, empresas e sociedade. Fazer com que o investimento feito em ciência e tecnologia possa chegar ao mercado passando por todas as etapas. Isto que está sendo o processo. Em 2010, o Ministério de Ciência e Tecnologia passa a incorporar no nome a letra I - da Inovação, Ministério de Ciência e Tecnologia e Inovação. A mesma lógica é seguida pelos Estados e Municípios. Tudo isto é um processo e estamos na direção e logo mais não teremos mais estas barreiras.

O Projeto Pró Natureza Limpa recebe o apoio de órgãos de fomento, como o CNPq, Fundação Araucária e também a Unidade Gestora do Fundo do Paraná.

 

Por Selma Becker

  

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