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OPINIÃO: Tragédia e Planejamento

Os recentes fatos na região serrana do Rio de Janeiro entristecem, revoltam e fazem refletir. Entristecem pelo drama humano e pelas vidas que se perderam. Revoltam por se saber que ao menos parte da tragédia poderia ter sido evitada. Promovem a  reflexão sobre porque isto não aconteceu.

18/01/2011 - 09:49


Uma análise da nossa cultura política e do nosso processo de desenvolvimento ajuda a entender estes fatos e propor algumas coisas. Fazem-se urgentes mudanças na forma de agir dos Estados e dos governos buscando o primado da razão técnica sobre o descaso de alguns políticos, da transparência sobre o obscurantismo nos gastos públicos, do planejamento sobre o improviso ou o atendimento pontual a emergências.

Lidar com estas questões não é fácil. Conforme apontou Édson Nunes em seu livro Gramática Política do Brasil nossa cultura política está alicerçada em algumas “gramáticas” das quais destaco: a do paternalismo e do clientelismo onde governantes consideram que o Estado é patrimônio seu ou de sua família atendendo à população que é “cliente” dos serviços públicos; outra é a do insulamento burocrático, ou seja, da burocracia isolada que se constitui como um lócus de poder, e há a do universalismo de princípios, ou seja, a da burocracia racional-legal de tipo weberiano. Analisando a história política brasileira, sobretudo no quesito do planejamento é possível perceber o quão lenta e gradual foi a penetração da idéia do planejar na vida pública brasileira. Nosso Estado estruturou-se organizando a vida econômica nacional de fora para dentro, ou seja, dos setores mais periféricos para os mais centrais e com uma séria resistência da burguesia nacional que via nisto uma “ameaça comunista”

Impossível não associar as ocupações irregulares à cegueira ou omissão do Poder Público que permite a ocupação delas num duplo favor: que os ricos desfrutem da natureza em seus condomínios de lazer , e que os pobres tenham sua “moradia” que posteriormente será atendida por outros “favores” como água, luz e asfalto.

Some-se a isto uma parca capacidade de prever desastres naturais e têm-se aí dois ingredientes de uma receita explosiva.

Uma outra questão a ser refletida é o processo levou aquelas pessoas a ocuparem áreas irregulares e/ou perigosas. Exceção feita ao Nordeste, o alagamento se deu em áreas desenvolvidas do país. Desnecessário dizer que aquelas pessoas estão lá minoritariamente por causa do lazer, e sim por causa do trabalho e de um processo de desenvolvimento que as concentrou nos morros e margens de rios da região litorânea do país.

Fala-se agora em vultosos investimentos em radares metereológicos, sistemas de alerta à população e reconstrução do que foi destruído. Isto é necessário, mas será inerte se não for devidamente implementado e acompanhado pela população. Pior: se ocupações irregulares não forem coibidas ou se a opinião técnica morrer nos ouvidos e nas mãos dos políticos.

Por outro lado, é preciso remover a população das áreas perigosas e irregulares, o que terá um custo imenso. Mas, não basta retirá-la :é necessário dar a ela condições de vida digna,  processo que requer capacidade estatal-burocrática de planejar e executar ações que visem ao desenvolvimento do país.

Aponta-se para a necessidade de que este não privilegie quase exclusivamente nossas áreas litorâneas. Vai uma crítica aos diversos PACs e obras para a Copa e para as Olimpíadas: não se deve perder a oportunidade de levar o desenvolvimento ao interior para que este se torne atrativo de população e para que este processo ajude a minimizar os desastres naturais. Lógico que o crescimento destas cidades deverá ser acompanhado da respectiva regularidade fundiária e estar alicerçado nos Planos Diretores Municipais ou se corre o risco da repetição da tragédia fluminense em outros locais.

Tudo isto aponta para o fato de que é preciso haver boa capacidade de planejamento e de execução descentralizada e de preferência sujeita ao mínimo de interferência política possível, rompendo drasticamente com o paternalismo e com o clientelismo nos três níveis de administração e piorados na maioria dos municípios pela baixa formação de funcionários públicos, prefeitos, secretários e vereadores. Aponta também para a necessidade de que a sociedade como um todo esteja atenta a estas questões e cobre as devidas ações do Poder Público.

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