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EDUCAÇÃO

No lugar da hierarquia, a rede. As pessoas não gostam mais de obedecer, defende Perissè

O professor doutor em Filosofia da Educação, Gabriel Perissè esteve nesta terça-feira (1), em Toledo proferindo palestras aos professores da rede municipal de ensino. Na manhã, Perissè abordou os pecados capitais no contexto da educação. E à tarde o tema foi o bullying. O professor destacou que uma vítima de bullying tende a ser um indivíduo violento no futuro e esta prática, está presente em todas as escolas e cabe a ela retomar o seu papel e ter projetos de enfrentamento, da mesma forma, que a cidades tem projetos de combate a dengue.

01/02/2011 - 17:46


Antes do professor Gabriel Perissè iniciar os trabalhos com os professores ele concedeu uma entrevista coletiva à imprensa local. Você acompanha os principais momentos abaixo, ou em vídeo.

O bullying está presente em todas as escolas?

Uma escola que diz que não tem o problema de bullying está mentindo, pois todas as escolas têm episódios de violência, humilhação, perseguição entre colegas. Atualmente com a internet se tem o cyber bullying, são pessoas que falam mal das outras anonimamente usando facebooks, orkuts. Qual o papel da escola perante este quadro inegável? Que instrumentos que a escola tem para que a vítima e família possam se orientar? E mais, se uma criança sai de uma escola e vai para a outra carregando um trauma ou sofrimento que tipo de acompanhamento será feito? Muitas vezes, as escolas não estão preparadas para esta situação. É preciso formular projetos para prevenir, combater e curar os problemas que acontecem no campo do relacionamento humano, especialmente no que diz respeito a violência. Uma escola despreparada que aguarda o pior momento está descumprindo a sua função. A função da escola é saber o que vai acontecer e o que está acontecendo e é preciso fazer alguma coisa bem clara, até com setas, vai até lá faça a sua denúncia. De maneira dramática, as pesquisas demonstram que muitas pessoas percebem, diariamente, atos de violência. Mas, elas somente percebem.

 

A violência não está naturalizada? E é por isso que não conseguimos reagir e definir políticas públicas para o enfrentamento ao bullying?

Nós nos acostumamos com isso. De manhã, a minha esposa levou as duas filhas na escola em São Paulo, um carro de um pai com duas crianças passou deliberadamente em velocidade e raspou na minha esposa e nas minhas filhas na frente da escola. A violência está presente em todos os níveis sociais: na família, no trânsito, nas empresas, na mídia, nos videogames, enfim em toda a parte. A violência entra pelos portões da escola como se fosse um integrante da comunidade escolar. Cabe, a escola que tem a consciência da formação fazer a denúncia.

 

Qual é o desafio do professor nesta nova realidade?

A formação docente é o calcanhar de Aquiles da educação brasileira. Em geral, os professores são conservadores. Isto faz parte do perfil do docente, porque a escola conserva o conhecimento, as regras, as atitudes, o patrimônio de uma cidade e do conhecimento de uma humanidade. Logo, o professor tende a ser uma pessoa conservadora e organizada. No entanto, a sociedade promove rupturas. Pensaremos na questão da internet: Meus alunos estão na idade mídia, eu estou na idade média. Há professores que estão com o seu mimeografo e há alunos com I Phone,  I Phode... O aluno está conversando com o colega pelo twitter e o professor está pensando se vai mandar um telegrama. Estas discrepâncias se manifestam depois em sala de aula.

 

Como ligar estas gerações?

Quem é o profissional nesta escola? É a mesma coisa que acontece numa família que está com tudo descontrolado, mas quem é o pai? Quem é a mãe? Quem detém a responsabilidade de conduzir o processo? Isto acontece na escola, porque o professor que perde o controle, que entra em estado de depressão, que fica violento, que desanima, ele precisa de ajuda, porque ele é o responsável para vencer a distância que há entre ele e seus alunos. Exemplo: Os médicos se conscientizaram que não adianta somente passar a receita. Eles também são professores, pois ensinam comportamento, modo de prevenir, critérios para tomar um remédio. E, o professor não deve passar somente uma lição de casa é, muito mais. É preciso se aproximar da linguagem dos alunos, da mentalidade e participar. Alguns autores mostram os novos paradigmas da sociedade que devem ser adotados pela escola, isto se ela não quiser ficar somente como um elemento de museu: No lugar da hierarquia, a rede. As pessoas não gostam mais de obedecer, elas gostam de participar, partilhar e compartilhar. Então, os professores devem participar das redes. Os professores devem conversar com os alunos de igual para igual, mesmo sabendo que está igualdade é estratégia de aproximação. Como você fala com um bebê? Você finge que fala com ele, porque você sabe que ele não entende nada. Para ensiná-lo a falar, você conversa com ele, acreditando que ele está te entendendo. É preciso ter algo parecido na escola. Não acreditamos mais em comandos, acreditamos em colaboração ativa. Não acreditamos mais em controle, acreditamos em capacitações. São palavras e conceitos novos que estão na mentalidade contemporânea, na internet e na mídia, e, que às vezes, os professores não conseguem assimilar. Eles precisam se capacitar e se integrar para que os alunos se sintam acompanhados. Alguns autores não falam mais professor, mas sim, acompanhante, guia, facilitador. A palavra professor ainda está carregada de autoritarismo, que não cabe mais, mas nós fomos formados por eles, professores que não permitiam o diálogo, professores que ficavam irritados quando alunos tomavam uma iniciativa.

Estes paradogmas estão presentes na escola, mas acontece que gostemos ou não, esta geração é toda anarquista, eles estão preparados para fazerem uma revolução. Perguntaram para a minha filha qual o nome dela e ela respondeu: Meu nome é Lígia.com.br. Ela já não é mais uma pessoa como eu fui. Minha filha me perguntou: Papai onde você vai estar? E respondi: Procura na minha agenda no site. Ela respondeu: Tá bom. Eles entendem está linguagem e os professores devem participar disso e fazer a junção entre o passado, o presente e o futuro. Ninguém deve falar mal ou caluniar o passado, porque somos aquilo que passou. Somos fruto do passado, mas não podemos caluniar o futuro e nem desprezar o presente, porque podemos não estar formando pessoas que vão sobreviver a nós.

 

No contexto escolar, qual é o pecado capital mais presente na escola brasileira?

O pecado capital mais grave é a gula. A gula não é comer demais, e sim, comer errado. Se você aplicar a gula no contexto educacional, ou seja, pensar naquilo que alimenta o professor. Muitas vezes, o professor se alimenta mal. Se o professor se alimenta mal intelectualmente e culturalmente: não vai ao teatro, não vai a um bom cinema, não tem bons hábitos de leitura, o aluno fica anêmico, porque ele se alimenta daquilo que o professor come.

E quando o aluno fica com fome, ele vai procurar fora da sala de aula. Na melhor das hipóteses ele vai para a internet; na pior das hipóteses ele vai para as drogas, para as bebidas, para o divertimento inconseqüente. É preciso que a sala de aula seja um banquete e que a virtude do alimentar-se bem esteja presente. Talvez este seja um dos pecados capitais mais graves. Infelizmente, os professores o cometem por falta de ajuda, acompanhamento e apoio. O nosso vale-refeição deveria ser um vale-biblioteca, em que pudesse comprar todos os meses R$ 50 ou R$ 60 em livros. Um professor que não lê, como vai fazer com que os alunos acreditem que a leitura alimenta. Os alunos são analfabetos, semi-analfabetos, analfabetos funcionais - e os professores? Quantos professores estão falando sobre um romance que estão lendo ou um filósofo que conhecem? Às vezes, os professores estão lendo Avon, Natura, nada contra, porque a vaidade não é pecado. Ela é necessária. O professor precisa está bonito para fazer o seu trabalho, mas agora se você se descuida da alimentação profunda, os alunos vão dizer que estão imitando o seu professor que também não tem muito conhecimento, não gosta muito do que faz, esta desanimado, aí vem a violência. A violência decorre do vazio. A fome pode provocar agitação, raiva e indisciplina.

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