O debate sobre a necessidade de proporcionar um maior equilíbrio na divisão dos meios de comunicação encerrou nesta sexta-feira (30) as atividades do 4º Fórum Internacional de Mídias Públicas. Os participantes avaliaram as mudanças que os países da América Latina têm vivido e as experiências ligadas à regulação dos meios de comunicação no Uruguai, no Equador, no Peru, na Espanha e na Argentina, além das discussões sobre o tema no Brasil.
Os defensores argumentam que é necessária uma ação do Poder Público para garantir um equilíbrio no acesso dos diferentes segmentos sociais aos meios de comunicação, possibilitando maior pluralidade de vozes.
O editor-chefe do jornal argentino Clarín, Miguel Wiñazki, criticou a nova legislação do país que regula o setor. Para Wiñazki, a legislação busca tirar a atenção dos escândalos do governo e dificultar o trabalho da imprensa. "A estratégia da presidenta Cristina Kirchner é polarizar para desviar dos debates. É um governo profundamente corrupto e, até agora, não refutou nenhuma denúncia de corrupção", disse.
"Muitos países advogam a necessidade de um novo modelo de participação do Estado na regulamentação dos meios de comunicação, o que, em alguns casos, se localiza dentro de critérios e planos de quem está no governo. Por outro lado, os grandes grupos dos meios de comunicação resistem a qualquer tipo de regulação [...] Se não existe um debate público sobre a matéria, então o que prevalece é a lei do mais forte", disse o especialista em meios públicos da Argentina, Martin Becerra. Segundo ele, o não debate sobre o tema tem gerado prejuízos para a sociedade. "Na Argentina, o que se faz hoje em dia é se perguntar quem é o mais forte", completou.
O diretor de Comunicação da Assembleia Nacional do Equador, Luis Dávila, falou sobre a nova legislação do país, aprovada recentemente. Segundo Dávila, as leis anteriores estabeleciam a possibilidade de que apenas uma única pessoa pudesse deter 96 licenças de rádio e TV. "Com isso, apenas 17 pessoas jurídicas poderiam ter todas as frequências de rádio e TV do país". Ele avalia que a mudança mais importante da nova legislação foi ter alterado esse quadro de concentração, determinando que 33% dos canais fiquem nas mãos da iniciativa privada. "Antes eram 90%. A lei também determina que os setores estatal (33%) e público (34%) complementem a divisão do espectro.
O governo do Uruguai também promoveu uma mudança no setor com a elaboração de uma nova legislação. Segundo o assessor da Secretaria da Presidência, Gustavo Gomes, o governo aproveitou o cenário de digitalização das comunicações e promoveu uma distribuição equitativa do espectro de rádio e TV. A legislação anterior tinha 36 anos e foi criada ainda na época da ditadura. Gomes disse que as acusações de que a lei promoveria a censura são falsas e só desviam o foco do debate. "Dos 183 artigos [da lei], apenas cinco dizem respeito a conteúdo. Destes, quatro tratam da proteção dos direitos de criança e adolescentes e o outro trata do combate ao racismo. A nova lei tem se centrado na democratização, estabelecendo cláusulas antimonopólio. Antes as concessões não tinham prazo, agora estamos colocando um prazo de 15 anos. Nos Estados Unidos o padrão são oito anos", disse.
No caso do Peru, após criar mecanismos de regulação, o país está incentivando mecanismos de autorregulamentação. "Não queremos que mude como ocorreu em outros países, achamos que é preciso uma instância de debate para incentivarmos as formas que são democráticas, disse o diretor do Instituto Imprensa e Sociedade do Peru, Ricardo Uceda.
O professor da Universidade de Brasília, Venício Lima, analisou a situação no Brasil. Segundo ele, neste momento não há no Brasil reforma dos meios que provoque qualquer consequência restritiva à liberdade de imprensa ou liberdade de expressão, "mas é sempre bom lembrar que quando se fala desse tema, as pessoas pensam que é somente o Estado que pode cercear a liberdade e esquecem que os empresários podem fazer o mesmo", disse.
Lima falou sobre a resistência em se regulamentar os artigos da Constituição que tratam sobre o tema. "O que tem havido no Brasil é uma resistência organizada, sistemática em relação a toda e qualquer proposta de reforma dos meios. Um exemplo é a questão dos meios de comunicação nas mãos de parlamentares, a Constituição veda expressamente isto". Ele lembrou também que a Constituição proíbe que os meios de comunicação social sejam, direta ou indiretamente, objeto de monopólio ou oligopólio.
Segundo Lima, no campo da comunicação, o Brasil avançou com a criação da Lei de Acesso de Informação e da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). "Foi a primeira grande manifestação no sentido do equilíbrio entre os sistemas privado, estatal e público. Até o surgimento da EBC a gente não tinha nenhuma positivação na ideia de um sistema público", destacou.
Da Agência Brasil