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SAÚDE

Cobrar por procedimentos de pacientes do SUS é corrupção, tal qual a que acontece em Brasília, diz Promotor

Para o promotor Alex Fedel a diferença dos atos de corrupção de Brasília e os daqui é só a oportunidade de obter maior valor

19/12/2015 - 02:06


Em coletiva à imprensa, na tarde desta sexta-feira (18), o Ministério Público - MP deu detalhes sobre a prisão do médico ortopedista Adilson Bier. Ele foi preso em flagrante na quinta-feira (17), pois segundo o MP teria cobrado de uma paciente do Sistema Único de Saúde - SUS R$ 4,6 mil pela realização de uma cirurgia, o que caracteriza pela prática de crime de corrupção passiva. Os promotores qualificaram o ato como corrupção, tal qual acontece em Brasília, e conclamaram as pessoas que já pagaram por procedimentos dentro do SUS para dirigir-se ao Ministério Público, que irá apurar o caso, e fará o possível para reaver o dinheiro das pessoas que foram lesadas.

A denúncia chegou ao Ministério Público por um parente da paciente, no último dia 16. Ele teria afirmado que a sua sogra recebeu uma solicitação de pagamento na quantia de R$ 4.600. “A cobrança seria para o médico realizar uma cirurgia em um dos joelhos. Porém no momento em que o paciente foi pagar a cirurgia, que foi feita no Hospital Bom Jesus, o setor financeiro do Hospital disse que aquela cirurgia tinha sido feita integralmente pelo SUS e que a família não deveria pagar nada, e que o familiar deveria procurar as autoridades responsáveis para apurar o caso”, relatou o Promotor da Saúde Tiago Trevizoli Justo.

O promotor apresentou a imprensa o passo a passo da ação. “O denunciante procurou um investigador da Policia, que o orientou a procurar o GAECO e este o orientou a procurar o Ministério Público, e assim ele o fez. Disse que o médico havia operado um joelho e a paciente precisava operar o segundo, o que só seria feito se pagasse a primeira cirurgia. O pagamento deveria acontecer até a data de que ele fosse retirar os pontos da primeira cirurgia, o que aconteceu na quinta-feira”.

O Ministério Público orientou a família para levar o dinheiro que teria sido solicitado pelo médico, para que eles pudessem fotocopiar as cédulas e registrar o número de serie. “No dia em que seria feito o pagamento o familiar nos procurou dizendo que seria impossível fazer este tipo de diligência porque a paciente estava com medo de não ter o outro joelho operado. O genro, sem o conhecimento da paciente, manteve-se firme e resolveu colaborar com o MP”.

Justo conta que, como não foi possível fotocopiar as cédulas recorreu a outra estratégia. “Eu retirei um dos envelopes que estavam em cima da minha mesa, de ofícios recebidos e fiz uma marca. Disse a ele para por o dinheiro dentro deste envelope. Na hora de pagar ao médico ele deveria entregar o dinheiro dentro do envelope, que estava rabiscado por dentro. Combinamos também que os policiais do GAECO iriam instalar nele, um momento antes de entrar para a consulta com o médico um gravador de voz para registrar a conversa no momento da entrega do dinheiro. Ao instalar o gravador os policias do GAECO conseguiram fotografar parte das cédulas que seriam entregues ao médico, de modo que poderíamos identificar seu número de serie”.

Após o genro fazer o pagamento e se retirar do consultório, os policiais do GAECO entraram e em seguida os promotores públicos. “Informamos ao médico o que estava acontecendo, porque nós estávamos lá. Que aquilo era em decorrência de uma denúncia de que ele havia recebido R$ 4600 para operar uma paciente do SUS e solicitamos se ele tinha dinheiro dentro do consultório. O médico disse que sim e pegou este mesmo envelope que estava na minha mesa. Perguntei a ele, em duas oportunidades, de onde era aquele dinheiro. O médico disse que era de honorários de serviços prestados de forma privada e que trouxe o dinheiro da sua clínica. Perguntei se ele tinha nota fiscal, ou recibo de todo aquele dinheiro. Disse-me que sim, que tudo o que ele faz é com recibo só que ia demorar um pouco para poder apresentar o recibo porque era de vários pacientes”.

O promotor Tiago Trevizoli Justo questionou o médico sobre a origem do envelope, o memso afirmou que era da sua Clínica. “Já aqui na Promotoria pedi que ele olhasse por dentro do envelope a marca do riscado dentro do envelope. Ele olhou e eu pedi para que conferisse a marca que estava no meu celular porque eu tinha fotografado o que fiz dentro do envelope. Depois disso pedi aos policiais se eles tinham confirmado a sequência das cédulas e eles disseram que sim. Neste momento dei voz de prisão pela prática de crime de corrupção passiva. Após o encaminhei para a autoridade policial, pois o delegado de policia que era o responsável para efetuar o auto de flagrante que o fez e encaminhou para o judiciário para decidir se vai soltar ou não e estipular fiança”.

No fechamento desta matéria a informação extraoficial era de que o Juiz responsável teria assinado o alvará de soltura e fixado fiança de R$ 20 mil. A informação na Delegacia de Polícia era de que até aquele momento, não tinha sido lançado no sistema nenhuma orientação e o médico se encontrava ainda preso.

Agravante

Foram apreendidos o computador e a agenda do médico. “Temos informação que a prática ocorre a mais de ano por este médico, esta parte da investigação corre sob sigilo, para facilitar as investigações”.

Justo explicou o rito de entrada do Sistema Único de Saúde e comparou como deveria funcionar e o que na prática acontece. “Ele foi preso por passar a frente um paciente do Sistema Único de Saúde. Ele furou a fila do SUS. Para ser atendido pelo SUS, a porta é a Unidade Básica de Saúde que se necessário fará o encaminhamento para o especialista, que fará a avaliação se precisa ou não cirurgia, se for necessária  - ele pede ao SUS para marcá-la, e esta acontece de acordo com as datas dos pedidos. Porém o médico tem uma certa liberdade para marcar esta cirurgia de acordo com critérios clínicos, podendo até alterar o posicionamento na fila de uma dessas pessoas. As mais graves  são operadas prioritariamente. Isso é a fisiologia do sistema é como deveria funcionar. Mas qual é a patologia do Sistema, a doença? A doença é que alguns médicos sabedores que a fila do SUS é demorada eles cobram de alguns pacientes que tem condições para que estes passem a frente daqueles pacientes que estão aguardando a muito mais tempo. E foi isso que aconteceu neste caso. Ele subverteu o Sistema, e atitudes como a dele é que provocam o colapso do Sistema”.

O Ministério Público promete mais rigor no controle do ordenamento da fila. “A promotoria da saúde vai lutar para que haja mais transparência nas filas eletivas do SUS. Que estes critérios sejam afixados em algum banco de dados, para que as pessoas saibam sua posição na fila de espera. E toda vez que uma pessoa for passar a frente de outra que haja uma justificativa escrita do profissional médico que fizer esta alteração na fila e que se juntem exames que comprovam a necessidade maior do paciente, isto será feito com base nas informações que temos, porque do jeito que está não podemos aceitar”, pontuou Justo.

Corrupção

O promotor foi enfático ao dizer que este ato é corrupção. “Não estamos dizendo que todos os médicos fazem isso, só os corruptos”, afirmou Justo. Esta ideia foi compartilhada pelos os promotores que também acompanharam o processo Dra. Daniela Cristina Arone Mogone e Dr. Alex Fadel.

A promotora disse que o médico poderá responder também na esfera do Patrimônio Público. “Este fato é passível de responsabilidade na esfera criminal, mas também é passível na esfera do patrimônio público, configura um ato de corrupção. Foi instaurado um processo pelo fato dele ser um servidor público”.

O promotor Alex Fadel lamentou que algumas pessoas foram para as redes sociais defender que o profissional médico tinha agido de modo adequado com a senhora. “A questão é: e se o genro dela não tivesse condição de pagar estes R$ 4600? O genro ouvido na promotoria da justiça disse que, esta senhora de 65 anos de idade, estava disposta a passar a escritura da casa dela para o médico, para que ela parasse de sentir dor. Para estas pessoas que acham que é  normal furar a fila do SUS e acham que o médico fez uma bondade, que pensem melhor sobre esses comentários que podem influenciar outras pessoas com ideias não muito cidadãs, afinal de contas o Sistema Único de Saúde – SUS é gratuito e ponto final”.

Para Fadel este ato é corrupção tal qual está ocorrendo em Brasília. “Isto é um recado para as pessoas que acham isso normal, não é! Isso é corrupção! Assim como estão acontecendo milhares de coisas em Brasília e a população sai às ruas pedindo justiça e pedindo ação do Ministério Público, pois bem, o problema não é só em Brasília, o problema é aqui também. Uma senhora que estava disposta a perder a casa para parar de sentir dor no joelho – e ainda tem gente que fala que o médico agiu corretamente?!”.

O promotor fez um apelo à sociedade para que colabore com as investigações. “Eu peço como promotor que as pessoas que de qualquer forma se sentirem coagidas com uma situação destas, que receberem propostas que procurem o MP, antes que aconteça, como o genro desta paciente fez. Vamos perder um pouquinho deste medo, que todo mundo tem, de mexer com gente poderosa. Se nós quisermos um Brasil melhor, nós precisamos de pessoas como esta que veio aqui assinou e colocou no papel sua denuncia e realmente era aquilo que ele falou”.

Os promotores orientaram as pessoas que já entregaram dinheiro por conta de operações e tratamentos para que procurem o MP. “Faremos o possível para que esta pessoa tenha o dinheiro de volta. É uma cobrança indevida. Corrupção não é só aquilo que acontece em Brasília, isso que o médico faz aqui, de cobrar  é corrupção do mesmo jeito. Ao furar a fila o médico cria duas listas de espera do SUS, a dos que tem dinheiro para pagar e a dos condenados , dos que nunca serão operados. A diferença dos atos de corrupção de Brasília e os daqui é só a oportunidade de obter maior valor”, defendeu Fadel.

O promotor Alex Fedel afirmou que as pessoas que pagaram por procedimentos SUS não respondem por corrupção, exceto se o ato foi promovido por ela. “O paciente que oferece vantagem para furar a fila, isso é corrupção ativa e o médico que aceita é corrupção passiva. Caso o médico solicitar o pagamento e o paciente apenas dá este dinheiro, então ele é vítima”.

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