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SAÚDE

Qualidade da alimentação está na pauta do Congresso e do Executivo

O uso de pesticidas é condenado por cientistas, mas visto como garantia de produtividade pelo agronegócio 

30/10/2018 - 15:01


O Brasil vive as contradições típicas de países em desenvolvimento no que se refere à alimentação: ainda tem áreas atingidas pela fome, mas sua população pobre já sofre de obesidade. Por outro lado, a despeito da enorme produção agrícola, desperdiça em média 28% na fase do consumo, incluindo aí hortaliças, arroz, feijão e carnes.

A qualidade da alimentação tem sido também fonte de disputas que envolvem rotulagem e uso de agrotóxicos. Do ponto de vista formal, o país até tem do que se orgulhar: a partir de fevereiro de 2010, incluiu na Constituição a ingestão de alimentos como direito social (artigo 6º). Cumpre assim o artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, assinada pelo Brasil.

Não pode deixar de ser mencionado, ainda, o fato de que o país adota políticas públicas direta ou indiretamente destinadas a diminuir a fome e a desnutrição em todos níveis da federação. Em 2015, durante homenagem no Senado aos 70 anos de criação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), o país foi apontado como exemplo por ter alcançado sucesso no combate à fome e à pobreza extrema, em decorrência de incentivos ao desenvolvimento rural, do apoio à pesquisa e à extensão agrícola e pecuária e ainda de programas de inclusão social como o Bolsa Família.

Na ocasião, o representante da FAO, Alan Bojanic, observou que o país, desde o ano anterior, não fazia mais parte do mapa da fome das Nações Unidas. Isso significa que menos de 5% da população brasileira estava nessa condição. “Já não é um problema estrutural, e sim de focalizar nos grupos mais vulneráveis que ainda existem. Não é um problema endêmico da sociedade brasileira”, explicou Bojanic, de acordo com a Agência Senado.

Tanto a continuidade ou reestruturação de políticas públicas na área de alimentação e nutrição quanto a mudança de normas de rotulagem e uso de pesticidas farão parte da extensa agenda legislativa de um Congresso renovado pelas urnas e do presidente da República que assumirá o cargo em janeiro.

Esses novos governantes encontrarão em andamento uma agenda de compromissos assumida pelo país a partir da adesão à Década de Ação das Nações Unidas sobre Nutrição (2016-2025), que tem como objetivo estimular ações intensificadas para acabar com a fome e assegurar o acesso universal a dietas mais saudáveis e sustentáveis para as pessoas.

O Brasil se tornou o primeiro país a assumir compromissos relevantes, tendo como horizonte o ano de 2019, a partir do chamamento da ONU: deter o crescimento da obesidade na população adulta (que atualmente está em 20,8%); reduzir o consumo regular de bebidas adoçadas com açúcar em pelo menos 30% na população adulta; e ampliar em no mínimo 17,8% o percentual de adultos que consomem frutas e hortaliças regularmente.

Para demonstrar que está disposto a cumprir esses compromissos, o governo brasileiro tem anunciado alguns esforços. Em maio, sancionou a Lei 13.666/2018 com o objetivo de estabelecer que a educação alimentar e nutricional seja incluída nos currículos escolares de alunos do ensino fundamental e médio de instituições de ensino público e privado.

Outra iniciativa do Executivo é um projeto em parceria com a indústria que estipula metas de redução de açúcar em alimentos processados, como refrigerantes, biscoitos e achocolatados, de acordo com recente anúncio do ministro da Saúde, Gilberto Occhi.

No Senado, está em tramitação o Projeto de Lei (PLS) 346/2018, que poderá proibir a distribuição e venda de bebidas como refrigerantes, néctares, refrescos, chás prontos para o consumo e bebidas lácteas nas escolas de educação básica públicas e privadas. O projeto, de autoria do senador Lindbergh Farias (PT-RJ), está em análise na Comissão de Assuntos Sociais (CAS).

Já os alimentos com alto teor de sódio poderão ter no rótulo ou na embalagem advertência ao consumidor sobre essa característica. Projeto com esse objetivo foi apresentado pelo senador Paulo Bauer (PSDB-SC). O PLS 392/2018 altera o Decreto-Lei 986, de 1969, para estabelecer que a autoridade sanitária deverá indicar quais alimentos apresentam elevado teor de sódio em sua composição nutricional.

Controvérsias

Outra questão atual é a preocupação com a quantidade de agrotóxicos que o brasileiro ingere. Também conhecidos como defensivos agrícolas, os agrotóxicos são substâncias químicas utilizadas há décadas para combater pragas e doenças nocivas à produção agropecuária.

O assunto é bastante controverso. Segundo dossiê publicado pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Um terço dos alimentos consumidos cotidianamente pelos brasileiros apresenta resíduos de agrotóxicos, de acordo com análise de amostras coletadas em todos os 26 estados do Brasil, realizada pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) da Anvisa (2011). Nada menos que 63% das amostras analisadas apresentaram resíduos, sendo que 28% apresentaram produtos não autorizados para aquele cultivo e/ou ultrapassaram os limites máximos de resíduos considerados aceitáveis. Outros 35% apresentaram contaminação por agrotóxicos, porém dentro dos limites.

"Se esses números já delineiam um quadro muito preocupante no concernente à saúde pública, eles podem não estar ainda refletindo adequadamente as dimensões do problema" alertam os autores do dossiê. Isso porque há muita incerteza científica na definição dos limites aceitáveis, já que os 37% de amostras sem resíduos se referem a produtos pesquisados (235 em 2010), o que não permite afirmar a ausência dos demais (cerca de 400), inclusive do glifosato, largamente utilizado (40% das vendas) e não pesquisado no PARA.

O sistema Único de Saúde (SUS) notificou 34.147 intoxicações por esses produtos entre 2007 e 2014. Esses e outros dados, incluindo o faturamento da indústria de agrotóxicos (R$ 12 bilhões em 2014), colocam o país, desde 2008, na posição de maior mercado mundial de agrotóxicos.

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