A ausência de pediatras nos plantões da rede pública submete pais ou responsáveis e crianças a ficarem horas aguardando por uma consulta e, principalmente, a buscarem pelo atendimento na rede privada. O problema é quando o profissional também não está atendendo neste local. Algumas pessoas têm condições de buscar o atendimento em outras cidades. Será que é a maioria?
A falta de plantonistas na pediatria foi discutida em diversos encontros no ano passado. Neste ano, o Ministério Público foi informado que os médicos pediatras e os gestores privados (Bom Jesus e HCO) firmaram o acordo de que aos finais de semana o profissional prestaria plantão em único local. Diante do acordo, a escala foi formatada, contendo data, horário, nome do profissional e local de atendimento.
Num determinado período, a metodologia teve êxito. Contudo, no último período, algumas pessoas denunciaram à promotoria a falta de pediatra na cidade. Diante disso, o promotor de justiça, José Roberto Moreira, promoveu uma reunião com gestores, pediatras, enfermeiros e demais profissionais para conhecer os fatos, analisar a situação e buscar uma solução.
No início da reunião, o promotor informou que o Ministério Público não emitiu despacho sugerindo ou concordando com a divisão da escala de plantão.
Casos
A oficial de justiça na Justiça do Trabalho, Olga Sabec Zanutto, buscou por atendimento pediátrico no último sábado, dia 30 de março, por volta das 19h15. Ela conta que a sua sobrinha, de 4 anos, acidentou-se em um dos parques do Município. Segundo Olga, a criança caiu do balanço e após um tempo começou a queixar-se de dor de cabeça. “Como ela não tem um plano de previdência, a criança foi levada ao mini-hospital. No local, fomos atendidos por uma pessoa, a qual solicitou que aguardássemos. Após 20 minutos, um segundo profissional nos encaminhou para o hospital Bom Jesus”.
Ela lembra que ao chegar ao Bom Jesus, um segurança estava na porta e informou que o pediatra estava de plantão no hospital HCO. “No HCO, percebi o desespero da recepcionista, porque ela tentava resolver o problema e informava que o plantão era do hospital Bom Jesus, mas estava buscando por um pediatra”.
Olga informa que durante o período que esteve no HCO cerca de dez crianças aguardavam por atendimento. “Uma criança (um ano e nove meses) tomou o medicamento controlado do irmão. Outra criança também tinha sofrido uma queda, estava com vômito e febre. No geral, a situação começou a ficar tumultuada”.
A oficial de justiça se propôs a pagar a consulta, entretanto, a recepcionista informou que não havia pediatra na cidade. Por volta das 20h30, a menina começou a ter sono e queria dormir. “Ficamos mais 1h20 no local e decidimos buscar por atendimento no hospital Campagnolo, o qual não presta atendimento nesta especialidade. Fomos para Cascavel (22h40) e conseguimos atendimento. A menina fez alguns exames, ficou internada por um tempo e voltamos para casa”.
A falta de atendimento na pediatria em Toledo sensibilizou a oficial de justiça e, por isso, ela decidiu fazer a denúncia no MP. “Diariamente, assisto esta situação nos programas e não acredito que ela se repete em Toledo. Naquele dia, muitas famílias aguardavam por atendimento aos seus filhos e não tinha médico disponível na cidade. É uma situação muito triste”.
O médico de carreira da Sanepar, Odacir Fiorentin, possui o convênio com a Fundação Sanepar necessitou do atendimento e também não encontrou pediatra nos hospitais Bom Jesus ou HCO. Ele conta que foi ao hospital Bom Jesus, a recepcionista preencheu uma guia e o informou que o médico plantonista estava atendendo no hospital HCO. “Fui ao HCO, a profissional preencheu uma nova guia. Então, retornei ao Bom Jesus me identifiquei e solicitei o documento. Quero explicações sobre o preenchimento de duas guias. Três horas e meia para o médico chegar ao local. Eu fiz a denúncia a Fundação Sanepar, a qual encaminhou o documento o MP”.
Como chefe da 20ª Regional de Saúde de Toledo, Odacir Fiorentin, afirma que o Estado possui um contrato com o Hospital Bom Jesus e não existe acordo de que o local pode ficar um final de semana sem plantonista. “Os pediatras devem fazer plantões no hospital e não revezamento. Para o caso do final de semana, auditores da Regional vai analisar a situação. Além disso, a regional promove reuniões com os prestadores de serviços para melhorar a gestão”.
O promotor destaca que está havendo descumprimento de um contrato, porque o Estado do Paraná possui um convênio com o hospital Bom Jesus por meio do Programa HospSUS e uma das condições é ter o serviço de pediatria integral. “Nós temos no processo cópia deste contrato”.
O gerente administrativo do Hospital Bom Jesus, Cleiton, afirma que a dificuldade da unidade é encontrar profissionais para resolver problemas da deficiência primária e não da urgência. “Em conversas com os médicos, eles informam que o valor de remuneração do hospital é bom, mas o problema é a demanda que chega até eles, pois parte dos encaminhamentos não deveriam chegar ao hospital”.
Por sua vez, o administrador do HCO, Luiz Eduardo Ribeiro, assumiu que o hospital deveria ter um pediatra de plantão no local no feriado de páscoa. “Não podemos obrigar que os pediatras viessem trabalhar, eles são profissionais liberais”.
O promotor de justiça, José Roberto Moreira, lembra que ao assumir a Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (meados de setembro e outubro de 2012) teve conhecimento de que não havia pediatras de plantão no sistema privado. “Me parece que os gestores tem dificuldades em cobrir os plantões, tanto no privado como público. Mas, devemos trabalhar com a demanda de profissionais do Município, pois não é competência do MP trazer novos pediatras para a cidade, entre outros fatores”.
O pediatra, Luiz Soares, relata que não é possível fechar os plantões nos três locais. Ele informa que cinco são os profissionais plantonistas e são dois hospitais mais o mini que necessitam de pediatras para sete dias e apenas cinco de plantões. Além que, os profissionais que se dispõem a serem plantonistas possuem uma faixa etária de 60 anos. “É humanamente impossível”.
Soares sugere que o valor salarial tenha um acréscimo para atrair novos pediatras para a cidade “Está sobrando vagas de pediatria na região, porque a categoria recebe somente por consulta. Sendo que, outras especialidades recebem por procedimento”.
O pediatra afirma que atualmente a conduta de um profissional é diferente do passado. “Nós optamos pela pediatria, porque gostamos da profissão. Hoje, o cidadão quer ingressar na medicina, porque quer receber um bom salário. O problema da falta de profissionais é em Toledo e região”.
Outras solução citada por Soares é o pediatra trabalhar sob aviso, ou seja, o clínico geral avalia o quadro do paciente e quando necessário chama o pediatra. Ele também acredita que a Prefeitura de Toledo poderia promover concursos para pediatras plantonistas.
Sobre o concurso para pediatra plantonista, a diretora do departamento de enfermagem, Cleonice Sarturi, informa que o último concurso abriu vagas para a contratação de pediatras plantonistas, os quais fizeram a prova, foram aprovados, mas quando o Município os chamou nenhum aceitou. “Esgotamos o chamamento de pediatras”.
Outro pediatra disse que muitos colegas deixaram de atender no Sistema, porque não recebiam o salário em dia. “Os profissionais precisam ser remunerados, sobretudo, serem valorizados. Qual pediatra terá estímulo de fazer plantão e aguardar meses para receber o salário? No dia 22 de dezembro do ano passado atendi 103 crianças, sendo que 50 eram do mini-hospital”.
O pediatra recebe no Município aproximadamente R$ 4,5 mil para realizar o atendimento de duas horas por dia. Por sua vez, um profissional T4 (no início de carreira) recebe aproximadamente R$ 6,8 mil para trabalhar 4 horas por dia. Nestes valores não estão contabilizadas as horas extras.
O secretário executivo do Ciscopar, Covatti, disse que o Consórcio repassa em média R$ 123 mil mensalmente para o pagamento de procedimentos urgência/emergência dos profissionais. Sendo que neste montante está incluído o atendimento pediátrico.
O coordenador do Procon, José Carlos Lichtow, afirma que os pediatras são prestadores de serviços aos órgãos e, por isso, eles tem seus direitos e deveres. “As reclamações são poucas na área da medicina e dos planos de saúde, mas o Procon está atuante, vigilante e as denúncias serão notificadas, promoveremos audiências e se preciso aplicaremos multas. Os gestores devem prestar um atendimento de qualidade”.
De acordo com o secretário de saúde, Edson Simionato, o número de pediatra plantonista é insuficiente. “A minha sugestão é concentrar o atendimento em único local. Do contrário, a equação não será concluída. Enquanto, o pediatra fazer plantão nos três locais, não terá solução”.
No feriado de Páscoa, o secretário afirma que o mini-hospital atendeu casos de convênios e particulares. Entretanto, no horário em que a senhora buscou pelo atendimento realmente não tinha profissional disponível. Naquele dia, o pediatra de plantão - 7h às 19h – realizou 68 consultas.
Simionato enfatiza que atualmente a rede pública possui mais profissional, no entanto, alguns não tem interesse em fazer plantão. “Não posso obrigar o profissional a trabalhar. Aquele que se dispõe pagamos hora extra via Ciscopar, sendo que este mecanismo não é recomendado pelo SUS. Também não é possível adverti-los, porque alguns deles apresentam atestado médico”.
O secretário informa que a escala de plantão para o mês está quase fechada, pois em alguns horários ainda não haverá atendimento de um pediatra. Contudo, em maio, a expectativa é que a situação seja normalizada.
Deliberações
Ao final da reunião, o promotor de justiça, José Roberto Moreira, disse que Promotoria vai oferecer uma resistência em concordar com uma escala em único local. Motivos: ordens prática e jurídica. Diante disso, o promotor vai aguardar a manifestação de cada gestor por até 30 dias.