Relatório desenvolvido pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), produzido com apoio do Itaú Social, traz um panorama internacional em relação aos anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano), revelando desafios expressivos da etapa nos países membros. A análise “Perspectivas internacionais para o fortalecimento dos anos finais do Ensino Fundamental: diálogos com foco em políticas para o Brasil” recomenda políticas baseadas em evidências internacionais para fortalecer essa etapa de ensino.
“O relatório da OCDE oferece insumos valiosos para o Brasil ao propor que políticas educacionais eficazes para os anos finais do Ensino Fundamental devem ser construídas sobre a base da escuta ativa dos estudantes, da promoção de ambientes escolares positivos e da adaptação às necessidades locais. As experiências internacionais, combinadas com os esforços recentes de toda a comunidade escolar, apontam para um caminho de maior resiliência e qualidade na educação brasileira”, explica Sonia Dias, gerente de Desenvolvimento e Soluções do Itaú Social.
Entre as iniciativas citadas, o estudo pontua que a escuta ativa e a participação dos estudantes são práticas que vêm ganhando força globalmente. Incentivar o envolvimento dos jovens, inclusive nos processos de tomada de decisão, tem mostrado efeitos positivos na motivação, autoestima e desempenho. Na Costa Rica, por exemplo, os "Diálogos Nacionais de Estudantes” representam uma iniciativa anual promovida pelo Ministério da Educação Pública que visa fomentar a atuação diretamente no processo de formulação de políticas educacionais. Esses diálogos oferecem uma plataforma para que os alunos expressem suas opiniões, compartilhem suas experiências e contribuam para a tomada de decisões que afetam a educação no país.
No Brasil, a OCDE destaca que o MEC (Ministério da Educação), em parceria com a Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação) e o Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação), tem trabalhado para fortalecer os anos finais. A criação do Programa Escola das Adolescências e do CONAPEA (Comitê Nacional para os Anos Finais) são exemplos desse esforço. O programa foi desenvolvido com a contribuição de gestores, professores e especialistas, além da escuta direta dos jovens. A Semana da Escuta das Adolescências nas Escolas, realizada em maio deste ano, foi uma ação estratégica que envolveu mais de 2,2 milhões de adolescentes de todo o país, incentivando sua participação ativa na melhoria da qualidade da educação.
Ambiente escolar
Conforme o levantamento, ambientes escolares positivos são fundamentais para aumentar a resiliência dos estudantes e sistemas educacionais, influenciando significativamente a motivação, autoestima e reduzindo comportamentos de risco. A longo prazo, um elevado senso de pertencimento na escola está ligado a melhores resultados em saúde mental, bem-estar e mercado de trabalho. Escolas que proporcionam espaços saudáveis de aprendizagem tendem a ter um funcionamento superior, evidenciado pelo aumento no desempenho em matemática e ambientação disciplinar.
O PISA 2022 aponta que escolas resilientes, capazes de se recuperar da pandemia de Covid-19, são mais seguras e acolhedoras, com fortes relações entre professores, estudantes e familiares. No entanto, a OCDE revela que poucos países, incluindo o Brasil, conseguem garantir índices positivos de pertencimento e disciplina escolar, já que os alunos brasileiros expressam sentimentos especialmente negativos em relação a esses aspectos.
Repetência escolar
Segundo a OCDE, os sistemas educacionais têm conseguido diminuir as barreiras para o avanço dos alunos dentro do sistema de ensino, mas ainda há muito a ser feito. Entre 2018 e 2022, a porcentagem de estudantes que reportaram ter repetido um ano escolar pelo menos uma vez caiu de 11% para 9%, uma redução de dois pontos percentuais. Alguns países, como o Brasil, apresentaram reduções superiores a seis pontos percentuais. Entretanto, em muitos sistemas, uma quantidade significativa de alunos ainda relata ter repetido um ano, inclusive nos anos finais. No Brasil, 1 em cada 5 jovens de 15 anos (22%) afirmou ter repetido um ano escolar, com 13% mencionando que isso ocorreu no ensino fundamental.
A Espanha é apontada no relatório como o país que tem se concentrado em garantir transições educacionais suaves e inclusivas, principalmente para estudantes em risco de reprovação ou abandono escolar. O programa PROA+ e a UAO (Unidade de Apoio à Orientação) são iniciativas significativas nesse contexto. O PROA+ visa a retenção de alunos em escolas públicas com uma alta proporção de jovens vulneráveis, oferecendo apoio adicional e criando ambientes de aprendizagem mais inclusivos. Já a UAO trabalha diretamente com estudantes e suas famílias, proporcionando orientação personalizada e promovendo a colaboração entre as escolas e os pais para mitigar o risco de abandono escolar.
Recomendações
A OCDE revela caminhos promissores e as possíveis ações que o Brasil poderia adotar para preparar alunos e fortalecer educadores dos anos finais, com foco em ouvir as suas necessidades e facilitar as transições educacionais. Confira abaixo:
- Continuar ouvindo os estudantes e educadores para entender melhor suas necessidades e preocupações e, principalmente, responder a elas de maneira prática e oportuna, visível para todos.
2. Apoiar e incentivar alunos e professores a projetar e implementar suas próprias intervenções para garantir que elas sejam adequadas às suas necessidades e ajudá-los a se sentirem capacitados. Isso pode ser feito atribuindo-lhes funções e responsabilidades específicas ou integrando requisitos relacionados aos processos de gerenciamento, ou às medidas de garantia de qualidade.
3. Reconhecer os gestores escolares como o ponto central da transformação de baixo para cima e, portanto, direcionar os apoios e as ações de implementação para eles. A mentoria para os gestores escolares pode ser particularmente impactante para responder à complexidade e sua função; as ferramentas digitais podem ajudar a oferecer isso em escala.
4. Criar condições estruturais que garantam que a inovação e a mudança locais estejam alinhadas com as prioridades e metas nacionais. Isso pode incluir o estabelecimento de determinados requisitos legais, diretrizes, padrões de referência, regulamentos e medidas de responsabilidade. Também pode ser necessário reavaliar o grau de responsabilidade dos atores em nível de escola por determinadas decisões para garantir que eles tenham liberdade suficiente para inovar e, ao mesmo tempo, sejam responsabilizados por suas ações.
5. Garantir que (alguns) educadores tenham tempo e espaço suficientes fora da sala de aula para inovar e promover mudanças. Para isso, será necessário garantir que esse tempo esteja disponível para eles sem aumentar as cargas horárias atuais e a complexidade do trabalho e que seja usado de forma construtiva na busca de prioridades estratégicas compartilhadas.