Morar em outro país é se jogar de cabeça em um golpe raso de espontaneidade. Não importa se você vai ter um subemprego, o importante é construir novos muros e derrubar preconceitos que a vida estabelece. Muitas histórias se conectam, pois é uma experiência de autoconhecimento onde percebemos que o choro e o sorriso são sentimentos intraduzíveis.
O coração grita calado com a falta da família, pois o que mata mesmo é a saudade. “É um ato de coragem e de renúncias. Definitivamente o pior é ficar longe da família, das pessoas que a gente ama, dos amigos e do conforto do dia a dia. Temos uma mudança interna. A distância do lar faz com que você mude a forma de ver as coisas”, disse Giovanni Pichler, de 32 anos. Ele era servidor público da Prefeitura de Toledo e está na Austrália desde junho para trabalhar e estudar inglês. “Aqui a gente chora e a saudade vira quase angústia. Você vê que precisa dos outros e se torna mais humilde”, completa Giovanni, que pretende ficar lá até o fim de 2017.
Já Larissa Barreto tem 20 anos e estudava geologia. Largou tudo para morar nos Estados Unidos, através do programa de intercâmbio Au Pair, onde é babá próximo a Chicago. Ela fala que sempre teve o sonho de morar fora no Brasil, e mesmo com saudade da família, tenta ser forte para não derramar uma lágrima. “Vir para cá não foi nenhum pouco difícil, tanto que não chorei em momento algum, nem mesmo no aeroporto enquanto me despedia de todos os familiares e amigos”.
Para o estudante de engenharia de Produção, Ricardo Saugo, de 22 anos, a viagem foi um alívio. "Eu estava em um momento conturbado da minha vida. Quando fui embora eu morava sozinho, estava em um relacionamento sério e minha família estava toda junta. Quando voltei minha irmã estava casada, meus pais haviam se divorciado e eu voltei a morar com minha mãe”. Ele passou um ano e três meses nos Estados Unidos pelo Programa Ciências Sem Fronteiras e até fez um estágio no Texas, onde auxiliava uma equipe a criar um metal regenerativo com o apoio da NASA.
Os três entrevistados concordam que durante a jornada os amigos se tornam uma família, e como em toda família, podem nos fazer passar por situações constrangedoras. No caso do Ricardo, ainda nos primeiros dias ele e os amigos foram a uma festa onde aconteceu um show de drag queen.
“No meio do espetáculo a apresentadora apontou para mim e me chamou ao palco. Eu estava muito envergonhado com a situação, então ela mandou jogarem luz em mim, quando de repente duas drags altas me levantaram pelo braço e me levaram ao palco. No início disseram apenas para eu dançar, mas depois começaram a fazer perguntas íntimas do tipo qual a minha posição sexual favorita”. Após a cena, Ricardo pulou do palco e saiu correndo até a portaria enquanto as drags gritavam para não deixarem-no sair. “Só sei que meus amigos e eu saímos correndo da balada”.
Larissa e Giovanni não têm histórias loucas assim. Larissa está de férias no Canadá junto com a família para quem trabalha, mas reclama que não tem idade o suficiente para ir às baladas “rebolar a bunda no chão”, enquanto Giovanni ainda se controla para não gastar dinheiro, no entanto faz alguns passeios por Sydney e região.
A adaptação e a maturidade também caminham juntas nesta experiência. Giovanni conta que agora se sente mais em casa. Ele mora com quatro brasileiros em um apartamento e diz que o trabalho o ajudou demais neste aspecto. “Foi um pouco difícil no começo. Homem que não tem inglês fluente geralmente recebem ofertas de trabalhos mais casuais. Mesmo assim é uma experiência incrível com vários detalhes que tornam a jornada menos difícil”. Ele vai focar no inglês e depois trabalhar para juntar dinheiro. “Penso em abrir um negócio quando voltar ao Brasil. Algo modesto e que eu sempre quis”, revela.
Larissa só pensa em voltar ao Brasil depois de um ou dois anos. “Gosto de tudo daqui, exceto a comida. Nessas horas sinto saudades do Brasil”. Ela ainda conta que não gosta do pensamento americano de acharem que a América se resume aos Estados Unidos. “Fui comprar um chip para o meu celular e o atendente achou meu sotaque muito forte. Ele perguntou de onde eu era e eu respondi ‘América do Sul’. Ele exclamou ‘Oh. Texas’. Eu confirmei simplesmente para ignorar o fato de ter ouvido aquilo”.
Já Ricardo fala que passou por uma situação interessante durante o intercâmbio. Ele estudou na HBCU, Universidade Historicamente Negra, onde era basicamente um dos únicos alunos de pele branca. “Eu entrava na sala de aula e ninguém sentava do meu lado. Formava um círculo ao meu redor. Meu colega de quarto estudava na universidade e quando chegávamos lá ele fingia que não me conhecia”.
Diante de tantas histórias uma coisa é certa. O choque cultural do intercâmbio agrega em diversos pontos da nossa vida. Talvez sua mãe chore incontáveis vezes por ver o ninho vazio, talvez ela te ligue com aquela voz embargada, sofrida, de quem tá guardando um mundo de saudade em um nó na garganta, mas é nesta experiência que o filho aprende a separar a roupa por cores na hora de lavar, que a louça continua na pia no dia seguinte e que festas e cervejas não são necessidades básicas. Não é algo fácil. Todos estão cientes da dor que é passar um longo período fora de casa sem poder contar cada detalhe do dia a dia. Mas todas as lágrimas e sorrisos vão vir junto com presentes quando eles voltarem para casa.
O texto contém fragmentos de “Quando a Gente Voltar/Não Tem Sobrenome” e “Mãe, eu preciso ir/Portal Raízes”.